MADDIE: O RESCALDO
"O "caso Maddie" começou por ser uma luminosa explosão de amor colectivo. Alheias às estatísticas, segundo as quais uma esmagadora maioria dos azares que acontecem a petizes de tenra idade é obra dos progenitores ou parentes próximos, as pessoas saíram à rua a demonstrar que a compaixão e a crendice humanas não têm limites. Algumas não se contentaram com a rua e seguiram para a praia da Luz, ou para onde uma qualquer concentração dos media ajudasse a divulgar a sua bondade. E os media divulgaram.
Lembro-me dos populares, dispostos a partilhar a dor do casal McCann e o fenómeno do momento. Uns contentavam-se em surgir na frente das câmaras, tão esmagados face ao destino da menina inglesa que mal lhes sobrava forças para ligar aos amigos a anunciar que estavam em directo nas televisões. Outros empenharam-se em ajudar nas buscas. Não falo apenas daquele tradutor espontâneo que acabou arguido: lembro-me dos cidadãos anónimos que perscrutaram baldios, dos videntes que se reuniram no Algarve a fim de "concentrar energias" em prol de Madeleine, de uma brasileira que atirava búzios para a areia como se a areia já não estivesse cheia deles.
E lembro-me da genuína aflição de multidões mundo afora, que nunca haviam visto a "pequena Maddie" e mesmo assim não sobreviviam sem ela. E das celebridades que pediam compaixão ao eventual raptor, na certeza de que raptor nenhum resistiria aos argumentos de Elton John ou de Cristiano Ronaldo. E do site do Vaticano, engalanado a preceito com o cartaz de "Procura-se".
Em suma, foram lindos esses meses dedicados à competição dos melhores sentimentos. Infelizmente, foram breves. Bastou aos investigadores divulgarem indícios vagos e provas imaginárias da culpa paterna para que, num instante, os McCann passassem de heróis a vilões no julgamento do povo, as celebridades corressem em retirada, o Vaticano retocasse o site, os jornalistas portugueses e ingleses encenassem uma versão actualizada do "Ultimatum" e a nossa polícia, na ausência de interlocutor à altura, desatasse a insultar a nossa polícia.
Quando acabam mal, ou arquivadas, ou reduzidas aos comentários do especialista Moita Flores, as histórias de amor são sempre tristes. Também é uma chatice a "pequena Maddie" não ter aparecido de todo. Mas, ao que se vê, esse pormenor é facilmente superável."
Alberto Gonçalves
Lembro-me dos populares, dispostos a partilhar a dor do casal McCann e o fenómeno do momento. Uns contentavam-se em surgir na frente das câmaras, tão esmagados face ao destino da menina inglesa que mal lhes sobrava forças para ligar aos amigos a anunciar que estavam em directo nas televisões. Outros empenharam-se em ajudar nas buscas. Não falo apenas daquele tradutor espontâneo que acabou arguido: lembro-me dos cidadãos anónimos que perscrutaram baldios, dos videntes que se reuniram no Algarve a fim de "concentrar energias" em prol de Madeleine, de uma brasileira que atirava búzios para a areia como se a areia já não estivesse cheia deles.
E lembro-me da genuína aflição de multidões mundo afora, que nunca haviam visto a "pequena Maddie" e mesmo assim não sobreviviam sem ela. E das celebridades que pediam compaixão ao eventual raptor, na certeza de que raptor nenhum resistiria aos argumentos de Elton John ou de Cristiano Ronaldo. E do site do Vaticano, engalanado a preceito com o cartaz de "Procura-se".
Em suma, foram lindos esses meses dedicados à competição dos melhores sentimentos. Infelizmente, foram breves. Bastou aos investigadores divulgarem indícios vagos e provas imaginárias da culpa paterna para que, num instante, os McCann passassem de heróis a vilões no julgamento do povo, as celebridades corressem em retirada, o Vaticano retocasse o site, os jornalistas portugueses e ingleses encenassem uma versão actualizada do "Ultimatum" e a nossa polícia, na ausência de interlocutor à altura, desatasse a insultar a nossa polícia.
Quando acabam mal, ou arquivadas, ou reduzidas aos comentários do especialista Moita Flores, as histórias de amor são sempre tristes. Também é uma chatice a "pequena Maddie" não ter aparecido de todo. Mas, ao que se vê, esse pormenor é facilmente superável."
Alberto Gonçalves
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