terça-feira, outubro 06, 2009

A noite em que Portugal continuou a avançar .

"Há muitos anos que os resultados do PCP não adiantam nem atrasam, aliás como a natureza do partido.

Alguns leitores escreveram a acusar-me de dois vergonhosos delitos: gostar de Manuela Ferreira Leite e lamentar a vitória do PS. A minha primeira reacção foi questionar-me: será que o meu correio electrónico sofre de vulnerabilidades? A segunda reacção foi evitar o e-mail e escrever aqui o seguinte. Alínea A: não gosto de qualquer político, carreira que, aliás, nenhum ser humano sensato ambiciona ou venera. Na perspectiva do mal menor, tolero os políticos que prometem, embora raramente cumpram, importunar menos a minha bolsa e a minha vida. Alínea B: enquanto colunista à cata de assuntos pícaros, não me importei com a vitória do PS. Enquanto contribuinte, pelas razões indicadas acima, sim. Porém, dado que é o colunismo a pagar os meus impostos, julgo que a contabilidade fica equilibrada. E agora, o balanço eleitoral:

PS

Na semana em que oficialmente empurrou o país para o último lugar no PIB per capita entre as 33 economias ditas "avançadas" (reclamações ao FMI, por favor), o PS venceu umas eleições em que foi o único partido a perder votos e deputados.

Consequentemente, depara-se com a novidade dos compromissos e das cedências, exercícios a que o eng. Sócrates não está habituado. Claro que a falta de hábito o pode levar a optar por um governo minoritário de facto, em pleno confronto com a oposição até a oposição derrubar o governo e, se a economia ajudar, novas eleições devolverem a maioria absoluta a um PS injustiçado e perseguido, coitadinho. É arriscado, mas as restantes possibilidades não o são menos. Simpatias excessivas com o CDS abrem o flanco a Manuel Alegre, aos sindicatos, à oposição de extrema-esquerda e ao espírito de "Abril" em geral. Os acordos à esquerda, por seu lado, obrigam a namorar os dois partidos comunistas em simultâneo e suscitam desconfiança do eleitorado ao "centro". Falta, é verdade, a hipótese de um arranjinho com um PSD "renovado", isto é, provido de uma direcção inclinada a servir de amparo ao eng. Sócrates e, pelo caminho, a desmantelar o pouco que ainda sobra do PSD. Não seria nada de extraordinário.

PSD

Manuela Ferreira Leite combateu, sozinha, quatro inimigos: a propaganda do PS; a vasta parcela do PSD que se empenhou em enxovalhá-la tanto ou mais que o PS; as prodigiosas aventuras de Cavaco Silva no reino da espionagem; e ela própria, que, da Madeira às "escutas", somou erros sucessivos e mostrou que chegar a primeiro-ministro era um peso que nunca sonhou carregar. Este desprendimento face ao poder, afinal o maior trunfo de uma campanha relativamente alheia às misérias da economia, constituiu um obstáculo adicional ao sucesso da dra. Ferreira Leite: se ela manifestamente não queria o poder, não seria o eleitorado a contrariá-la. Daqui em diante, a sua permanência na liderança apenas adiará um futuro que cabe ao PSD escolher. Infelizmente para o PSD, a escolha ideal, Rui Rio, não parece possível, e a escolha admissível, Paulo Rangel, não parece provável. Marcelo é dúbio e, em eventual necessidade, "presidenciável". Sobram os sempre disponíveis Passos Coelho, Aguiar-Branco, talvez Santana Lopes e, quem sabe, Luís Filipe Menezes, eu, você, dois trapezistas, o pato Donald, etc. Antes do futuro, o PSD dispõe de um longo passado à sua frente.

CDS

Segundo me dizem, o extraordinário resultado do CDS, obtido graças ao esforço de Paulo Portas, alargará o grupo parlamentar do partido a gente convictamente liberal na economia, uma espécie por enquanto ainda ausente na direcção. A confirmar-se, não constituirá um abalo profundo no regime, mas um pequenino sinal de que, mesmo em Portugal, a luta política pode não ser só um concurso para apurar quem jura torrar mais dinheiro alheio. Sonhos à parte, hoje a maior tentação de Portas é o seu maior perigo: sustentar o governo em troca da fragrância do poder. Aí, lá irá o hipotético liberalismo por água, ou por S. Bento, abaixo.

BE

Como disse Francisco Louçã, o Bloco de Esquerda obteve a maior subida eleitoral de qualquer partido e de sempre. Faltou acrescentar: e a mais inútil. Na ausência de uma maioria aritmética com o PS, os novos deputados são de uma redundância que confrange ou, no caso do dr. Louçã, confunde. Na noite eleitoral, o homem estava notoriamente confundido. Seguro de que chegara ao poder, desatou a proclamar vitória, a despedir ministros e a ameaçar a populaça. Ficou uma amostra do que sucederia se o poder fosse real e não um lapso neurológico.

PCP

Há muitos anos que os resultados do PCP não adiantam nem atrasam, aliás como a natureza do partido
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Alberto Gonçalves

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