Sobre o ‘rating’
"Muito se tem falado sobre as agências de ‘rating’, mas, a avaliar pela maioria das opiniões, a ignorância sobre o assunto é vasta.
Poucos parecem saber que as agências não avaliam quem escolhem, mas quem quer ser avaliado. São os devedores que pedem às agências que lhes atribuam notas e pagam para isso uma taxa periódica (que não é barata). Portanto, se não querem ‘ratings', têm bom remédio: cessem os contratos e digam que não querem mais notações.
Depois, há a ideia de que as agências são um produto americano, a que se acrescentam, muitas vezes, intencionalidades ocultas, como a destruição do euro. As três principais agências - S&P, Moody's e Fitch - operam, de facto, a partir dos EUA. Mas a Fitch é detida maioritariamente (60%) por um grupo francês, Fimalac, e é o resultado de uma fusão (de que resultou o controlo maioritário europeu) entre a agência europeia IBCA (especializada em ‘rating' bancário) e a "pequena" agência americana Fitch.
Há mais agências no mundo e até em Portugal existe a CPR. Só que essas - com excepção, talvez, da japonesa JCR -, além de pequenas, não conseguiram suficiente projecção mundial para ombrear com as "três grandes".
Mas se ter ‘rating' é escolha dos devedores (e estes pagam para o ter), porque é que não abdicam dele? Porque isso lhes reduziria significativamente a base de investidores potenciais (e, consequentemente, a ‘pool' de investimento) a que querem aceder, na expectativa de conseguir custos de financiamento duradouramente mais baixos do que se estivessem dependentes apenas da exígua base de quem os conhece directamente. E porque é que os ‘ratings' alargam a base de investidores potenciais? Porque funcionam como uma espécie de "certificação" do devedor.
Imagine-se um fundo de pensões no Iowa americano, que quer investir em obrigações. Se quisesse escrutinar todos os emissores com títulos no mercado teria que analisar as contas dos quase 200 países e dos vários milhares de empresas do mundo. O custo de tal tarefa seria insuportável para o benefício esperado, pelo que acabaria por se confinar a investir na meia dúzia mais conhecida (e mais rica).
Agora imagine-se que há milhares de investidores nas mesmas circunstâncias e percebe-se que isso cria uma oportunidade de negócio para quem se disponha a fazer essa avaliação, disponibilizando os resultados numa notação sintética e facilmente apreensível: é o que fazem as agências de ‘rating'. É por isso, pois, que os devedores pagam para ter ‘rating': para constar do "radar" de todos os investidores mundiais.
E é por isso também que se verificou uma concentração de agências: perante uma multiplicidade de ‘ratings' para os mesmos devedores, que acabava por complicar a sua própria esccolha, os investidores foram convergindo na preferência por duas ou três, que foram ganhando mais reputação, e foram estas que acabaram por prevalecer, com o papel (talvez demasiado) dominante que hoje têm. O remédio? Como em qualquer outra actividade, a mais concentração terá que corresponder mais regulação."
Vitor Bento
Poucos parecem saber que as agências não avaliam quem escolhem, mas quem quer ser avaliado. São os devedores que pedem às agências que lhes atribuam notas e pagam para isso uma taxa periódica (que não é barata). Portanto, se não querem ‘ratings', têm bom remédio: cessem os contratos e digam que não querem mais notações.
Depois, há a ideia de que as agências são um produto americano, a que se acrescentam, muitas vezes, intencionalidades ocultas, como a destruição do euro. As três principais agências - S&P, Moody's e Fitch - operam, de facto, a partir dos EUA. Mas a Fitch é detida maioritariamente (60%) por um grupo francês, Fimalac, e é o resultado de uma fusão (de que resultou o controlo maioritário europeu) entre a agência europeia IBCA (especializada em ‘rating' bancário) e a "pequena" agência americana Fitch.
Há mais agências no mundo e até em Portugal existe a CPR. Só que essas - com excepção, talvez, da japonesa JCR -, além de pequenas, não conseguiram suficiente projecção mundial para ombrear com as "três grandes".
Mas se ter ‘rating' é escolha dos devedores (e estes pagam para o ter), porque é que não abdicam dele? Porque isso lhes reduziria significativamente a base de investidores potenciais (e, consequentemente, a ‘pool' de investimento) a que querem aceder, na expectativa de conseguir custos de financiamento duradouramente mais baixos do que se estivessem dependentes apenas da exígua base de quem os conhece directamente. E porque é que os ‘ratings' alargam a base de investidores potenciais? Porque funcionam como uma espécie de "certificação" do devedor.
Imagine-se um fundo de pensões no Iowa americano, que quer investir em obrigações. Se quisesse escrutinar todos os emissores com títulos no mercado teria que analisar as contas dos quase 200 países e dos vários milhares de empresas do mundo. O custo de tal tarefa seria insuportável para o benefício esperado, pelo que acabaria por se confinar a investir na meia dúzia mais conhecida (e mais rica).
Agora imagine-se que há milhares de investidores nas mesmas circunstâncias e percebe-se que isso cria uma oportunidade de negócio para quem se disponha a fazer essa avaliação, disponibilizando os resultados numa notação sintética e facilmente apreensível: é o que fazem as agências de ‘rating'. É por isso, pois, que os devedores pagam para ter ‘rating': para constar do "radar" de todos os investidores mundiais.
E é por isso também que se verificou uma concentração de agências: perante uma multiplicidade de ‘ratings' para os mesmos devedores, que acabava por complicar a sua própria esccolha, os investidores foram convergindo na preferência por duas ou três, que foram ganhando mais reputação, e foram estas que acabaram por prevalecer, com o papel (talvez demasiado) dominante que hoje têm. O remédio? Como em qualquer outra actividade, a mais concentração terá que corresponder mais regulação."
Vitor Bento
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