segunda-feira, fevereiro 09, 2009

9 de fevereiro de 1943

A extenuante rotina dos ataques japoneses e do bombardeio pelo "Expresso de Tóquio" até a conquista final da ilha.

À batalha da crista de Lunga seguiu-se um período de calma. Os americanos dedicavam-se a diversas tarefas no acampamento. Quando não chovia, iam lavar as suas roupas impregnadas de suor, em um rio situado a 1.500 metros do aeródromo. Dali podiam ver, na outra margem, os japoneses, que tornavam banho e usavam sabonetes, cujo forte perfume atravessava o rio. Também tinham que suportar os toca-discos nipônicos, que repetiam incessantemente a canção "Home, sweet home" e, às vezes, para grande surpresa sua, os interpelavam, mencionando os seus nomes. Os bombardeiros japoneses de grande altitude - que continuavam a aparecer irregularmente - atiravam, juntamente com as bombas, panfletos de propaganda cujas capas exibiam lindas raparigas nuas e de opulentas formas. Mas estas imagens já não sugestionavam os soldados americanos, enfraquecidos pela malária e pela disenteria. Ficavam coladas, pela chuva ao solo esponjoso e a selva apodrecia aqueles corpos nus traçados no papel ainda mais depressa do que os corpos de carne. Chegou, por fim, o grande comboio no qual se perdeu o Wasp. Trazia víveres, remédios, canhões, munições e milhares de fuzileiros com uniformes novos.


Em fins de setembro, os japoneses, apesar de todos os esforços norte-americanos, tinham desembarcado em Guadalcanal uma divisão inteira. A situação tornou-se inquietante. Sem recursos suficientes para empreender uma ação decisiva (havia excessivo número de navios de grande tonelagem em reparo), o Almirante Ghormley resolveu, não obstante esse fato, assestar um rude golpe no "Expresso de Tóquio".Três cruzadores pesados, dois ligeiros e cinco destróieres, sob as ordens do Contra-Almirante Scott, postaram-se ao sul de Guadalcanal. A aproximação do "Expresso" foi assinalada na tarde de 11 de outubro. Excepcionalmente numeroso, era constituído por destróieres - que navegavam à frente - quatro ou cinco cruzadores e, atrás, sete ou oito transportes. Quando caiu a noite, a esquadra norte-americana rodeou Guadalcanal pelo noroeste, formando em linha de combate diante do Cabo Esperança.


Acabava de virar para oeste e navegava a 25 nós quando o "Expresso" surgiu, perpendicularmente a ela. Os japoneses sofreram uma surpresa tão completa como a dos americanos na Batalha de Savo. O cruzador pesado nipônico, considerado o objetivo nº 1, afundou com uma brecha no casco, iluminado por chamas fulgurantes. Os japoneses demoraram dez minutos a responder ao fogo dos americanos e, em menos de cinco, tinham desaparecido quatro dos seus navios. Finalmente, ouviu-se o estampido dos seus canhões. Afundaram um destróier norte-americano e avariaram seriamente um cruzador ligeiro, mas foram obrigados a retirar-se, com a perda de três ou quatro cruzadores, quatro ou mais destróieres e um transporte.Em 12 de outubro, 6.000 soldados dos Estados Unidos desembarcaram em Guadalcanal, quatro lanchas torpedeiras (punhais destinados ao "Expresso de Tóquio", se acaso se atrevesse a voltar), fundearam em Tulagi. Os fuzileiros respiraram aliviados, mas fizeram-no depressa demais. No dia seguinte tornou-se evidente que os japoneses consideravam a sua derrota do Cabo Esperança como um "pequeno incidente". A escolta do "Expresso de Tóquio" integrava, nessa noite, dois couraçados, um cruzador e oito destróieres. O aeródromo foi bombardeado durante hora e meia e a maioria dos aviões pulverizados.


Retomaram o seu ataque na noite seguinte, com cruzadores e destróieres. O número de aviões existente em Guadalcanal ficou reduzido a um, enquanto o "Expresso" continuava a desembarcar tropas e artilharia, prosseguindo, com mais audácia do que nunca, os seus terríveis bombardeios noturnos. A máquina japonesa parecia, agora, de tal modo reforçada, que já coisa alguma podia fazê-la parar. A partir do dia 20, as tropas recém-desembarcadas principiaram a "exercer uma forte pressão sobre as linhas norte-americanas", as quais se encontravam agora sob o fogo dos canhões japoneses instalados no Monte Kayo. A 23, mal baixou a noite, o "Expresso de Tóquio" iniciou o mais violento bombardeio de toda a campanha. Os americanos compreenderam que desta vez não se tratava de fustigar as suas linhas, mas sim de uma "preparação" conforme todas as regras. O ataque terrestre desencadeou-se logo que terminou o bombardeio, à meia-noite e um minuto. Os canhões do Monte Kayo formaram uma cortina de fogo, atrás da qual avançaram os carros, seguidos pela infantaria. Quatro vezes os japoneses atacaram e quatro vezes foram repelidos.


Ao amanhecer, em plena selva, numa atmosfera quase irrespirável, por causa da fumaça dos carros destruídos, investiram novamente. Vandegrift lançou no combate todos os seus efetivos; não só os fuzileiros, mas também a infantaria desembarcada no dia 12; e fez vir ainda, para os apoiarem, os aviões ocupados em bombardear concentrações de navios de carga e de transporte japoneses. O ataque foi outra vez repelido.A 25, pela manhã, o "Expresso" voltou, efetuando novos desembarques no Cabo Esperança. De noite, recomeçou o canhoneio, ainda mais violento do que na véspera. Alguns dos americanos soluçavam: "Meu Deus, será possível que nunca mais acabam com isto?" Não houve qualquer intervalo entre a preparação da artilharia e o novo ataque. O bombardeio transformou-se simplesmente em cortina de metralha para proteger o avanço dos carros japoneses.

"Durante a noite de 25 para 26 de outubro, a ofensiva terrestre inimiga atingiu o máximo de intensidade". Os veteranos nunca tinham suportado nada semelhante. Abriu-se uma brecha na frente norte-americana e os japoneses apoderaram-se de parte do aeródromo. Ao amanhecer a batalha fragmentara-se em combates entre pequenos grupos de homens esgotados. Alguns americanos encontravam-se num estado muito próximo do desespero; mas a resistência nervosa dos japoneses não estava menos abalada.Durante o dia Vandegrift encurtou a frente, falou às suas tropas, e, com um regimento de fuzileiros à frente, desencadeou um contra-ataque. Queria libertar o aeródromo e repelir inimigo até à entrada da selva, mas os japoneses não retrocederam um centímetro sequer. Os 2.200 nipônicos que defendiam o aeródromo foram exterminados sem se renderem. Henderson Field, a "posição-chave" de Guadalcanal, tinha sido reconquistada. Apesar disto, a situação das tropas de Vandegrift era quase desesperada, a infantaria japonesa, desembarcada na véspera, não havia entrado ainda em ação e uma força naval japonesa, composta por quatro couraçados, três porta-aviões, cruzadores pesados e ligeiros, destróieres, transportes e barcos auxiliares, no total de quarenta navios, aproximava-se de Guadalcanal. O Almirante Kinkaid - que comandava uma nova força-tarefa norte-americana - sai, então, ao seu encontro com o Hornet e o Enterprise.


A 26 de outubro trava-se a Batalha de Santa Cruz; os japoneses perdem dois porta-aviões, o Hornet é posto a pique; vários navios dos Estados Unidos ficam avariados, incluindo o Enterprise. Mas os japoneses retiram-se uma vez mais, renunciando a apoderar-se de Guadalcanal numa ação decisiva.Há pesadelos nos quais se tem a impressão de que tudo volta a principiar de novo, interminavelmente; debatemo-nos neles e avançamos à custa de esforços terríveis, compreendendo angustiadamente que nunca saímos, afinal, do mesmo lugar... Assim Verdun. Assim Guadalcanal. E penso que, talvez, neste ponto, o leitor sinta uma espécie de vertigem, que o Verdun do Pacífico principie a parecer como um túnel, unicamente iluminado por súbitos e fulgurantes relâmpagos, a intervalos regulares.

No dia seguinte à Batalha de Santa Cruz, os americanos desembarcaram tropas em Guadalcanal (o maior contingente depois do primeiro desembarque). Em 30 de outubro o cruzador Atlanta bombardeia as posições japonesas: cabe agora aos amarelos atirar-se ao chão, colar o rosto contra a terra mole da selva. No dia seguinte, os homens dos Estados Unidos atacam. Têm a superioridade numérica e o seu moral está fortalecido. Avançam. Atravessam o Rio Matanikau. Continuam a avançar, "Então isto é que é Guadalcanal?" - perguntam os recém-desembarcados. Esperem um momento... Os japoneses acabam de fortalecer o "Expresso de Tóquio". Desembarcam 1.500 soldados de infantaria naval com material de guerra. Durante o dia 3 de novembro, detêm de novo a ofensiva norte-americana. Reavivam-se os combates terrestres e os americanos tornam a avançar. Os comandos exterminam, na selva, 700 japoneses que batiam em retirada. Os nipônicos deslocam-se para as colinas e o panorama torna-se mais claro. Parece que o pesadelo chega ao seu termo e que os japoneses vão-se ver obrigados a renunciar a Guadalcanal; mas o que fazem realmente é concentrar uma frota em Rabaul! Volta-se ao mesmo ponto.


Ou melhor: quase ao mesmo ponto. Em terra a situação dos americanos é melhor do que antes de Santa Cruz. No mar, pelo contrário, é assustadora. A menos que desistam de Guadalcanal, será preciso que enfrentem forças consideravelmente superiores."A mais encarniçada batalha naval dos tempos modernos" - escreveu um historiador norte-americano a propósito deste encontro decisivo. No Pacífico houve batalhas mais importantes, mas foram aeronavais. Aqui a luta ia-se desenrolando unicamente com o uso de canhões e torpedos e, por assim dizer à queima-roupa, como em Savo e no Cabo Esperança. O mesmo campo de batalha a mesma escuridão.


Em Savo, os americanos foram apanhados de surpresa. No Cabo Esperança, os japoneses tiveram a mesma sorte. Desta vez, não houve surpresa para ninguém. O Contra-Almirante Callaghan dispôs a sua esquadra em linha de combate: os cinco Cruzadores ao centro, quatro destróieres à frente e quatro na retaguarda; formação pouco ortodoxa; mas no meio daquela escuridão, que formação poderia considerar-se ortodoxa e qual se manteria uma vez iniciado o combate? Callaghan sabia perfeitamente que a tática teria pouca importância neste encontro.A meia-noite começou a aproximar-se das águas do canal entre Guadalcanal e Flórida, falando pelo microfone às tripulações dos seus navios. A 1h a estação de radar instalada na ilha comunica: "Aí estão!" Callaghan continua a avançar. A 1h 30min, o primeiro barco japonês acende os seus refletores. Callaghan deu ordem de fogo.

A batalha naval que se iniciou agora foi depois denominada, simplesmente, Batalha de Guadalcanal. Dura de 11 a 15 de novembro. Constituiu uma vitória decisiva para os norte-americanos, que fizeram fracassar a Armada japonesa a caminho de Guadalcanal."Apesar das graves baixas que nela sofremos, a Batalha de Guadalcanal foi uma das vitórias decisivas. A partir de então, as nossas posições nas ilhas meridionais do Arquipélago das Salomão não voltariam a ser ameaçadas seriamente". Tais as palavras do Almirante King.Entre esta vitória naval e a ocupação total da ilha decorreram ainda quase três meses. Depois desta série de combates, os japoneses não tornaram a realizar qualquer ofensiva importante. Guadalcanal deixara de ser um teatro de operações navais.


Em terra, os americanos progrediram lentamente. Como andar depressa naquela selva? Além do mais, já não havia a mesma urgência. Os fuzileiros navais foram substituídos por soldados de infantaria que passaram, certamente, dias difíceis, mas de modo algum comparáveis ao pesadelo dos três primeiros meses. Agora, os soldados que vinham render os seus companheiros, bem como as provisões, chegavam com regularidade. No céu, todos os aviões que se viam eram norte-americanos. O "Expresso de Tóquio" voltava de longe em longe, mas furtivamente, sem se demorar. Durante os primeiros dias de fevereiro pareceu mais numeroso e mais assíduo do que era habitual. Que aconteceria? Provocou inquietação. Mas não por muito tempo: o "Expresso" vinha retirar os últimos japoneses de Guadalcanal. A 9 de fevereiro de 1943, pela manhã, a ilha infernal era dos Estados Unidos.


Fontes deste artigo:
Grandes Crônicas da Segunda Guerra Mundial - Georges Blond - Seleções
Guadalcanal.

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