sexta-feira, setembro 24, 2010

A última vítima do Holocausto

"Um amigo anda há dias a contar a piada óbvia: Woody Allen correu com a célebre Carla Bruni de um filme e ninguém se indignou; o marido da sra. Bruni correu com uns anónimos búlgaros e romenos e mesmo o habitualmente diplomático Durão Barroso acha o gesto intolerável.

Graçolas de péssimo gosto à parte, eu sei que as boas consciências deram em atacar em coro o sr. Sarkozy. Assim de repente, também não acho louvável que um Estado da UE despache cidadãos europeus aos magotes e, ainda por cima, fundamente o despacho com a respectiva etnia. Por mais, note-se, que as limitações à livre circulação concedam a esse Estado o direito de recambiar gente que não trabalha, ou não faz descontos, ou constitui um encargo para quem o acolhe. E por mais que a fascinante cultura da etnia em causa atire com frequência os seus membros para a caridade pública e, a fim de comporem o sustento, para a economia paralela ou pior.

O que me parece exagerado são os epítetos com que as boas consciências brindam o sr. Sarkozy. Com a franqueza do costume, os exaltados do costume, incluindo uma comissária europeia, acham que a expulsão de uns tantos ciganos (o eufemismo em voga é roma) de França representa um novo Holocausto. Eu tenho dúvidas.

Na II Guerra, pelo menos 200 mil ciganos terão morrido nos campos de extermínio devido aos motivos da praxe: doenças, fome, exaustão e, numa fase tardia do conflito, o gás. Para já, as autoridades francesas deportaram cerca de oito mil ciganos, nuns casos directamente para os (razoavelmente civilizados) países de origem, noutros impelindo-os para as fronteiras vizinhas, onde, sob os auspícios de advogados especializados nestas coisas, os deportados aguardam um minutinho e regressam calmamente a França, enquanto beneficiam em paz de 90 dias "turísticos" e livres de ameaças. Daqui a três meses, se necessário, repetem a habilidade. Suponho que Auschwitz fosse ligeiramente pior.

Ainda bem para os ciganos do sr. Sarkozy, ainda mal para Auschwitz, que hoje serve de termo comparativo a quase tudo, desde o degredo algo injustificado de uma comunidade até à criancinha que entrou em depressão porque na escola a apelidaram de "maricas". E este pressuposto de que cada acto estúpido, deplorável ou remotamente tonto equivale ao horror absoluto do nazismo não só desvaloriza o horror como legitima a estupidez: o sr. Sarkozy, aliás, já aproveitou os insultos desproporcionados para se passear como vítima, razão que lhe assiste mas que sem os idiotas de plantão não assistiria
."

Alberto Gonçalves

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